Sunday, October 30, 2011

Como lidar com os anjos e demônios interiores « Leonardo Boff

Como lidar com os anjos e demônios interiores

24/10/2011
por Leonardo Boff

O ser humano constitui uma unidade complexa: é simultaneamente homem-corpo, homem-psiqué e homem-espírito. Detenhamo-nos no homem-psiqué, vale dizer, no seu mundo interior, urdido de emoções e paixões, luzes e sombras, sonhos e utopias. Como há um universo exterior, feito de ordens-desordens-novas ordens, de devastações medonhas e de emergâncias promissoras, assim há também um mundo interior, habitado por anjos e os demônios. Eles revelam tendências que podem levar à loucura e à morte e energias de generosidade e de amor que nos podem trazer autorealização e felicidade.

Como observava o grande conhecedor dos meandros da psiqué humana C.G. Jung: a viagem rumo ao próprio Centro, devido a estas contradições, pode ser mais perigosa e longa do que a viagem à Lua e às estrelas.

Há uma questão nunca resolvida satisfatoriamente entre os pensadores da condição humana: qual é a estrutura de base de nossa interioridade, de nosso ser psíquico? Muitas são as escolas de intérpretes.

Resumindo, sustentamos a tese de que a razão não comparece como a realidade primeira. Antes dela há todo um universo de paixões e emoções que agitam o ser humano. Acima dela há inteligência pela qual intuimos a totalidade, nossa abertura ao infinito e o êxtase da contemplação do Ser. As razões começam com a razão. A razão mesma é sem razão. Ela simplesmente está aí, indecifrável.

Mas ela remete a dimensões mais primitivas de nossa realidade humana das quais se alimenta e que a perpassam em todas as suas expressões. A razão pura kantiana é uma ilusão. A razão sempre vem impregnada de emoção e de paixão, fato aceito pelo moderna epistemologia. A cosmologia contemporânea inclui na idéia do universo não apenas energias, galáxias e estrelas mas também a presença do espírito e da subjetividade.

Conhecer é sempre um entrar em comunhão interessada e afetiva com o objeto do conhecimento. Apoiado por uma plêiade de outros pensadores, tenho sempre sustentado que o estatuto de base do ser humano não reside no cogito cartesiano (no eu penso, logo sou), mas no sentio platônico-agostiniano (no sinto, logo existo), no sentimento profundo. Este nos põe em contacto vivo com as coisas, percebendo-nos parte de um todo maior, sempre afetando e sendo afetados. Mais que idéias e visões de mundo, são paixões, sentimentos fortes, experiências seminais, o amor e também seus contrários, as rejeições e os ódios avassaladores que nos movem e nos põem marcha.

A razão sensível lança suas raizes no surgimento da vida, há 3,8 bilhões de anos, quando as primeiras bactérias irromperam e começaram a dialogar quimicante com o meio para poder sobreviver. Esse processo se aprofundou a partir do momento em que surgiu o cérebro límbico, dos mamíferos, há mais de 125 milhões de anos, cérebro portador de cuidado, enternecimento, carinho e amor pela cria. É a razão emocional que alcançou o patamar autoconsciente e inteligente com os seres humanos, pois somos também mamíferos.

O pensamento ocidental é logocêntrico e antropocêntrico e sempre colocou sob suspeita a emoção por medo de prejudicar a objetividade da razão. Em alguns setores da cultura, criou-se uma espécie de lobotomia, quer dizer, uma grande insensibilidade face ao sofrimento humano e aos padecimentos pelos quais tem passado a natureza e o planeta Terra.

Nos dias atuais, nos damos conta da urgência de, junto com a razão intelectual irrenunciável, importa incluir fortemente a razão sensível e cordial. Se não voltarmos a sentir com afeto e amor a Terra como nossa Mãe e nós, como a parte consciente e inteligente dela, dificilmente nos moveremos para salvar a vida, sanar feridas e impedir catástrofes.

Um dos méritos inegáveis da tradição psicanalítica, a partir do mestre-fundador Sigmund Freud, foi o de ter estabelecido cientificamente a passsionalidade como a base, em grau zero, da existência humana. O psicanalista trabalha não a partir do que o paciente pensa mas a partir de suas reações afetivas, de seus anjos e demônios, buscando estabelecer certo equilíbrio e uma serenidade interior sustentável.

A questão toda é como nos assenhorear criativamente de nossa passaionalidade de natureza vulcânica. Freud se centra na integração da libido, Jung na busca da individuação, Adler no controle da vontade de poder, Carl Rogers no desenvolvimento da personalidade, Abraham Maslow no esforço de autorealização das potencialidades latentes. Outros nomes poderiam ser citados como Lacan, Reich, Pavlov, Skinner, a psicologia transpessoal e a cognitiva comportamental e outros.

O que nos é permitido afirmar é que, independentemente, das várias escolas psicanalíticas e filosóficas, o homem-psiqué se vê obrigado a integrar criativamente seu universo interior sempre em movimento, com tendências dia-bólicas e sim-bólicas, destrutivas e construtivas. Por acertos e erros vamos, processualmente, descobrindo nosso caminho.

Ninguém nos poderá substituir. Somos condenados a ser mestres e discípulos de nós mesmos.

Thursday, October 27, 2011

Problema Missionário: a reprodução dos erros nacional em outras terras.


 Recebo semanalmente emails e mensagens no Facebook falando sobre a importância do trabalho missionário, mas hoje, acho que deveríamos repensar algumas coisas importantes com respeito a missão da igreja e o trabalho transcultural. Recomendo a leitura de meu artigo na revista theologando . A primeira coisa que me ocorre é que trabalho transcultural é comunicação de conteúdo cultural. Entendo que a mensagem do evangelho se encaixam em qualquer cultura, mas junto com ela, existem os elementos coadjuvantes relativos a própria cultura do missionário. Neste sentido, essa coisas que chamamos de igrejas evangélica brasileira é uma sub-cultura tipicamente brasileira que me preocupa, pois contem muitos elementos dissonantes ao evangelho. Me pergunto se os missionários estão levando a mensagem do Cristo, ou apenas reproduzindo seus próprios erros em outros países. Não vou nem discutir a questão da igreja universal (IURD) e os congêneres, pois nada têm de Cristãos. Ademais as igrejas que parem mais sérias comunicam um evangelho que ao invés de libertar os ouvintes, apenas abre a porta para o cristianismo neopentecostais. Afirmo isso porque a doutrina da prosperidade está incubada nas igrejas tradicionais, bastando observar que apenas pessoas ricas e bem colocadas são eleitas como liderança. Falta na igreja brasileira um ensino que leve as caminhantes à liberdade e autonomia. Liberdade no sentido de entender que Deus nos faz livres para experimentar sua vida em nos, livres das heteronomias religioso do não toque, não coma. Outrossim, uma liberdade de escolhas e de consciência para que se experimente Deus na vida real. Nas igrejas ainda discute-se questões como a mulher obedecendo ao marido, ou o membro obedecer ao pastor, no sentido de que a causa e origem de todos os problemas sociais sejam derivados a desobediência destas práticas tidas como naturais e divinas. Certamente que a Bíblia afirma a relação de obediência da mulher ao homem, conquanto seu texto escrito em um período onde as mulheres ficavam em casa, e os homem trabalhavam fora, repare que isso mudou já a alguns anos, e ainda bem que mudou, pois apensar dos problemas (familiares e trabalhistas), ainda sim caminha-se para uma situação de mais possibilidade de escolhas. Não seria mais cristão que o marido e a mulher vivessem segundo relações de amizade e carinho? Eu escolho estar com esta pessoa, ao invés de estou casado porque deus/pastor/igreja ordenou? Semelhantemente a relação pastor/membro torna-se doentia, porque imagina-se o pastor como autoridade, ao passo que se esquece que somos todos igualmente humanos, pastor deveria pastorear as pessoas para que cresçam e não comandá-las para que obedeçam. Fica a dica, mas pense no problema missionário. Que estamos comunicando para os povos africanos e orientais? Valores machistas e ultrapassados? Não deveríamos ensinar essas pessoas a ler a Bíblia como ela é ao invés de leituras espirituais estranhas de sonhadores malucos? Não deveríamos levar a essas pessoas um entendimento sobre a condição humana ao invés de leis e práticas religiosas? Pastor é aquele que ajuda no caminho ou um líder empresarial de sucesso? Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará...essa verdades não é apenas afirmar uma teologia, mas sim a busca um entendimento do que realmente a coisa é. ler os seguidores a pensar e buscar entendimento claro com respeito ao mundo e a si mesmo. Infelizmente essa é uma coisa que a igreja brasileira não tem feito....Salvo exceções.

Friday, December 22, 2006

Escolhendo a Boa parte.

Uma Leitura de Lucas 10:38-42

Todo final do ano é a mesma história: planos e projetos; engordar ou emagrecer; ler mais a Bíblia, orar mais, fazer mais para Deus. Gostaria de convida-lo a uma leitura que poderá nos ajudar a montar nossos projetos para o próximo ano.

Leitura do texto: Lucas 10:38-42

38 Indo eles de caminho, entrou Jesus num povoado. E certa mulher, chamada Marta, hospedou-o na sua casa. 39 Tinha ela uma irmã, chamada Maria, e esta quedava-se assentada aos pés do Senhor a ouvir-lhe os ensinamentos. 40 Marta agitava-se de um lado para outro, ocupada em muitos serviços. Então, se aproximou de Jesus e disse: Senhor, não te importas de que minha irmã tenha deixado que eu fique a servir sozinha? Ordena-lhe, pois, que venha ajudar-me. 41 Respondeu-lhe o Senhor: Marta! Marta! Andas inquieta e te preocupas com muitas coisas. 42 Entretanto, pouco é necessário ou mesmo uma só


Este texto fala de dar, ou seja, fazer para Deus, e de receber de Deus. Sendo importante para aqueles que já estão a algum tempo na igreja. Marta e Maria são dois tipos de crentes dentro da Igreja, sendo que Maria representar o crente que entender a vida cristã como Jesus a quer, e Marta o tipo de cristão que se perde em si mesmo.

Nós cristãos, fazemos o mesmo que Marta, levando Jesus para dentro de nossas vidas. Não apenas para nossa salvação, mas para a transformação de nossas casas, amigos e do mundo. Jesus nunca se recusa a entrar em nosso coração, todavia, parece recusar-se a operar fora de nossa vontade, optando sempre por nos ensinar o caminho e esperar que o trilhemos.

O ensino de Jesus se distancia em muito das praticas religiosos de sua época, pois não era um ritual ou uma benzição, como muitos faziam, antes era explicações a respeito da vida e de Deus. Sua ciência pedagógica organizava-se em uma linguagem que todos podia compreender. Assim como possuímos a Bíblia, que em alguns momentos não a compreendemos, mas em sua maior parte ela contém ensinos simples de serem praticados. Em 2 Reis 5, temos um homem que queria ser curado, e quando encontrou o profeta ficou chateado por não receber uma benzedura, antes o profeta sugeriu que tomasse um banho no rio. Somos assim, esperamos sinais e maravilhas, mas nos recusamos a praticar a busca na palavra de Deus, que é a Bíblia.

O texto contém uma oração muito estranha, “Senhor, não te importas de que minha irmã tenha deixado que eu fique a servir sozinha? Ordena-lhe, pois, que venha ajudar-me” Quantas vezes não fazemos a mesma oração, ou simplesmente ficamos a ruminar em nossos corações este mesmo sentimento? Na cultura dela, e na nossa, ela estava certa, pois não é justo que uma pessoa trabalhe e outra fique olhando. Mas devemos observar as palavras de Jesus a partir da perspectiva do reino de Deus e não das leis humanas.

Antes de servir, é necessário receber. Receber a Deus e receber de Deus. Assim como Jesus ordenou aos discípulos que esperassem em Jerusalém que fossem revestidos de poder, o cristão necessita aprender e experimentar Deus para poder efetuar a obra de Deus.

Quando trabalhamos na obra de Deus, pelas nossas próprias forças e desejos de fazer, chegaremos ao esgotamento espiritual. Quando estamos esgotados e secos, ficamos amargurados e ao invés de sermos benção, somos maldição, pois “da boca sai o que está cheio o coração”.

Marta ser achou a vitima do sistema, a “ultima coxinha da estufa” a “ultima bolachinha do pacote”, assim como o profeta Elias[1]. E muitas vezes sentimos a mesma coisa, sem contudo entender o porque. Ai oramos a Deus por ajuda, sem contudo pensar que nosso estado emocional é conseqüência de nossa falta de organização, ou seja, trabalhamos demais e oramos de menos. O texto diz apenas uma coisa é suficiente, e esta coisa é receber, ouvir e aprender de Deus. Tudo é conseqüência direta disto.

A vida aos pés de Jesus é o bem inalienável que perdura pela eternidade. A vida com Jesus é a boa parte. Assim como o irmão do filho pródigo não compreender o porque de seu pai aceitas seu irmão de volta, mesmo tendo feito o que fez, Marta não entendeu o que era a melhor parte. Marta distraiu-se com muitas coisas, por isto não pode aproveitar a melhor parte.

A promessa é que a melhor parte nunca nos será tirada. Todas as coisas como ministério e obras para Deus são secundárias em detrimento ao estar aos pés de Jesus, em comunhão com ele.

Todo pode ser retirado de nos, mas o fruto de fazer a vontade de Deus é eterno e não se perde. Fazer a vontade de Deus não significa fazer um monte de coisa, pois, é Melhor obedecer do que Sacrificar[2]. E a promessa de Jesus para a vida cristã é um fardo leve[3].

Estamos no final do ano, já planejando o 2007. Este texto nos convida a escolhermos a “melhor parte” no próximo ano. Devemos nos planejar para estarmos mais perto de Deus e servi-lo de forma correta. Pois, se assim o fizermos, seremos abençoados com a graças de cumprirmos a vontade de Deus, sem nos esgotarmos espiritualmente.



[1] 1 Reis 19:18

[2] 1 Samuel 15:22

[3] Mateus 11:30

Wednesday, July 19, 2006

Cheiro de Cristo

Cheiro de Cristo: Uma leitura de 2 Corintios 2:14-17


O que o evangelho de Cristo significa para nós? Esta é uma pergunta importante que devemos sempre nos fazer, pois o efeito da Palavra de Deus em nossas vidas é a medida de nossa espiritualidade. Nossa comunhão com Deus não deve ser medida pelas bênçãos materiais ou por dons sobrenaturais maravilhosos, mas sim pelo quanto estamos nos tornando parecidos com Cristo, ou como diz Paulo, o quanto estamos cheirando a Jesus.

È certo que todas as vitórias que conquistamos são fruto da Graça de Deus, todavia a mais importante das vitórias é o testemunho que damos ao mundo. Neste sentido é que Paulo alegremente afirma que está triunfando, ou fazendo o desfile da vitória, mesmo não tendo conseguido abrir uma Igreja em Troade[1].

Paulo relaciona o conhecimento de Cristo com cheiro, pois o cheiro é algo que todos são obrigados a sentir. O verdadeiro testemunho não é feito apenas por palavras, cultos e folhetos, mas principalmente pelo estilo de vida daqueles que com Cristo andam. Ser discípulo de Cristo é a opção existencial de imitar o modelo proposto por Jesus.

Humanamente falando, isto não parece grande coisa, pois viver como Jesus não se encaixa aos modelos de poder, arrogância e vitória que são apregoados em nossa cultura. Mas com a graça divina, cada ato que fazemos com o sentido de imitarmos a Cristo chega as narinas de Deus como algo muito melhor que os sacrifícios que os Judeus faziam no Antigo Testamento. È a graça de Deus que faz isto ser sublime e maravilhoso. Este cheiro também chega as pessoas a nossa volta, de forma que através de nossas ações Deus é manifesto em suas vidas.

Este estilo de vida, para alguns, é morte, pois significa um insulto a seus hábitos errados, mas para aqueles em que o Espírito de Deus já está a operar, é a porta para uma nova vida, saindo da morte e entrando na vida. Para nos, que somo discípulos de Jesus, tal é estilo vida e vida em abundancia.

Nos tempos de Paulo, havia muito pregadores que andavam pelas Igrejas pregando coisas que não representavam o evangelho verdadeiro. Tinha a intenção de agradas as pessoas[2], e não a Deus. Todavia, o evangelho que Paulo pregava era completo, pois levava as pessoas a tomarem decisão, entre morte e vida. Pois isto ele diz que o evangelho que ele pregava cheirava Cristo, ou seja, vida para os que se salvavam e morte para os que se perdiam.

Se desejarmos viver a vida vitoriosa que Paulo viveu, devemos nos relaciona com Deus através de Jesus. Pois, ele é a manifestação da graça de Deus por nos, sem merecimento ou qualificações nossas, mas apenas com amor divino. Deus nos ama independentemente de nossos pecados e falhas, mas cabe a nos ouvirmos sua voz e respondemos de forma coerente. Buscado a transformação das nossas mentes[3], almas, estilos de vida e tudo mais que necessita ser transformado a imagem e semelhança de Jesus.

Também não devemos ser Mercadores da palavra de Deus. Isto significa que não devemos pregar a palavra de Deus para ganharmos[4] alguma coisa das pessoas, ou faze-lo por qualquer outro motivo que não seja a Glória de Deus. Outro aspecto, é que não devemos nos relacionar com Deus de forma comercial, ou seja, orar na base da troca como alguns tem pregado hoje em dia. Quando recebermos alguma benção, devemos entender que a benção é fruto da Graça, não de alguma coisa que possamos ter feito. Da mesma forma, devemos pedir a Deus baseados na bondade dele, não impondo condições como por exemplo: Se o Senhor fizer isto, eu vou dar R$xxxxxx de oferta, Ou vou dar R$xxx de oferta para o Senhor faz aquilo para mim..[5]. Isto faz mal a nós, pois quando Deus não faz a nossa vontade, ficaremos pensando que ele nos odeia, ou em alguns casos, que ele não existe.

· Por fim, que o cheiro do conhecimento de Cristo seja para nos cheiro de vida. Que a vida com Jesus, apensar das lutas e dificuldades que possamos enfrentar, seja fonte de alegria e contentamento. De forma que não necessitemos buscar em outros deuses, a alegria que só pode ser achada em Jesus Cristo, nosso Senhor.



[1] Ver versos anteriores.

[2] E ganhar algum dinheiro com isto.

[3] Romano 12:1-2

[4] O termo Mercadores da Palavra de Deus possui um sentido negativo, como trapaceiro

[5] se o Senhor não fizer isto, eu não vou mais na Igreja...

Wednesday, May 31, 2006

Pobre homem rico - Uma leitura de Marcos 10:17-21

Pobre homem rico....

Uma leitura de Marcos 10:17-21

Deus ama mais os ricos ou os pobres? Esta pergunta parece de difícil elucidação à luz de algumas visões teológicas cristãs, ou não, que tem sido propaladas em nossos dias. Se procurarmos os adeptos da Teologia da Prosperidade, podemos considerar que Jesus gosta dos ricos mais do que dos pobres. Por outro lado, se formos aos adeptos da teologia da Libertação, Deus ama apenas aqueles que sofrem e odeia aqueles que tem e não repartem.

Gostaria de sugerir uma leitura do texto contido no Evangelho de Marcos 10:17-22, onde está narrado o encontro de Jesus com um homem rico. Este debate tem profundas implicações para a construção de um paradigma que sirva de modelo para uma vida cristã integral em nossos dias.

Tradução do Autor: Marcos 10:14-22

17 e Pegando ele seu Caminho adiantou-se um homem e prostrando-se Perguntou lhe: Mestre Bom, Que faço para herdar a vida eterna?

18 Jesus lhe respondeu: Porque me chamas Bom, Ninguém Bom se não um, o Deus.

19 Aos mandamentos aprenda: Não mate, não adultere, não roube, não de falso testemunho, não defraude, honra teu pai e tua mãe.

20 Disse o homem: Mestre, todas estas coisas eu tenho guardado desde minha juventude.

21 Com isto, Jesus olhando-o amou-o e disse-lhe: De uma coisa necessitas! Vai, vender tudo que tens, dê aos pobres e terás tesouro no céu, depois venha após mim.

22 Mas chocado com estas palavras, partiu chateado, pois possuía muitas riquezas.

Uma das grandes perguntas existenciais humanas, que todas as religiões tentam responder é: O que devo fazer para herdar a vida eterna?

Primeiramente, esta é uma pergunta existencial, pois envolve algo de essencial na reflexão humana sobre sua própria natureza, no sentido de para onde iremos e sobre onde estaremos quando morremos.

Tal é a importância desta questão, que grandes monumentos da antigüidade, como as pirâmides e outras formas de túmulos que podem ser encontrados em quase todas as grandes culturas antigas. Sendo que todas estas obras a priore, correspondem a um edifício teológico filosófico que visaria explicar e propiciar formas práticas de se garantir um descanso eterno.

Vejamos que a pergunta que o homem rico fez a Jesus, tem esta mesma função, de forma que poderíamos reescreve-la assim: que faço para aplacar a ira divina que me condena a morte eterna, de forma que possa herdar a eternidade?

Vale destacar a importância da palavra herdar quando conectada ao fato de ele ser um homem rico. Somando-se ao fato de Mateus o chamar de jovem, isto implica que as riquezas foram herdadas de graça, portanto pretender-se-ia que a vida eterna fosse recebida pela imposição de mão de Jesus.

Mediante ao apresentado, podemos supor que o homem gostaria de ouvir de Jesus uma resposta mística e sobrenatural, como Naamã perante Elias. Todavia o mestre dos mestres faz o que vai na direção contraria a todas as expectativas daqueles que crêem na religião mágica. Ele apenas relembra que só Deus é bom e aponta diretamente para as leis sociais dadas a Moisés. Leis que tem a finalidade de levar seus praticantes a um estilo de vida que prefigure o reino de Deus. Portanto, a espiritualidade não pode esta dissociada do mundo real e das relações humanas, as quais somos responsáveis.

Então, poderíamos supor que aquele homem não praticava de forma correta as relações sociais, as quais, todo aquele que busca ao Deus da aliança deveria desempenhar. Observemos que, no inicio do capitulo dez de Marcos, Jesus discute com os Fariseus a respeito do divórcio, o qual era permitido pela lei mosaica. Mas a lei apenas normalizava um pecado decorrente de uma incapacidade humana de cumprir seus deveres sociais. Da mesma forma, quando Jesus abençoa as crianças, simbolicamente, Jesus cumpre o principio que os pais não eram capazes de cumprir, pois o divórcio é uma forma de maldição sobre os filho de um casal.

Uma leitura da frase de Jesus: “Vende tudo o que tens, dá aos pobres e terá um tesouro no céu.” Faz-nos supor que aquele homem confiava em suas riquezas e isto o impedia de ter tesouros espirituais oriundos dos relacionamentos sociais alicerçados em Deus.

No fim do capítulo, podemos observar que aqueles que tudo deixam por causa de Jesus, recebem 100 vezes mais em vida. Isto aponta para o fato que as relações sociais construídas sobre os parâmetros das Escrituras Sagradas são indubitavelmente mais compensadoras que as relações construídas sobre os referenciais de troca que a sociedade impõe.

Poderíamos tomar para nós, enquanto cristãos que procuram vivenciar uma vida cristã integral, que nossas relações sociais devem ser modificadas de forma que prefigurem o próprio reino de Deus na vida daqueles aos quais estamos ligados direta e indiretamente. De forma a desempenharmos a função de sacerdotes do reino de Deus na vida uns dos outros

Para acumularmos tesouros no céu, deveríamos ser mais humanos com as pessoas de nossas comunidades cristãs. Mais humanos com os vizinhos, companheiros de trabalho, funcionários e patrões. Com diz Adriana Defentti, uma pessoa não pode agir de qualquer maneira, senão que lhe faça sentir pessoa. Se o que fizermos nos faz sentirmos como pessoas, poderemos entender os demais seres humanos com pessoas e seguir na construção de relacionamentos consistentes e duráveis.

O estilo de discipulado que Jesus praticou com seus doze discípulos está baseado justamente na questão do relacionamento interpessoal. Vejamos que a maioria das vezes que Jesus disse coisas profundas ou fez milagres, os discípulos não compreenderam. Mas a pessoa Jesus estava presente em suas vidas, seu exemplo e sua prática.

O relacionamento do discipulado é uma troca, onde as pessoas estabelecem ligações que perduram ad eternum. Todavia, esta perspectiva traz o medo da exposição. Medo de se perder a individualidade e o poder sobre a própria vida. Pois aquele que discípula deve estar aberto para o discípulo, que no futuro será um igual, não um inferior.

O discipulado que Jesus praticou levou seus discípulos a abandonar tudo, e segui-lo como crianças. Mas, para aquele homem, seguir Jesus significava uma mudança de vida tão radical que seria impraticável. Abandonar suas riquezas, sua família e seus amigos ricos o tornaria algo que ele mesmo abominava, um pobre.

Quando aquele homem procurou Jesus, sua intenção era apenas a de receber a vida eterna. Lembremo-nos do menino que doou os pães e os peixinhos da multiplicação. Este homem não esta a fim de doar, no máximo, ele se disporia a comprar a salvação, se Jesus colocasse um bom preço.

A espiritualidade Cristã é uma via de duas mãos onde o receber e o dar são faces de uma mesmo moeda. Ninguém que seja incapaz de dar-se pelo outros é capaz de vivenciar uma vida cristã plena e frutífera.

Se assim for, a decisão daquele homem em abandonar Jesus foi correta. Pois é melhor não seguir Jesus do que fazê-lo com Judas o fez. O caminho da maturidade Cristã exige de cada um a correta avaliação de si mesmo. Devemos questionar-nos sobre o que realmente queremos de Jesus e sobre o que estamos dispostos a abandonar por causa dele.

Não que apenas os perfeitos devem seguir o caminho, mas o caminho de Cristo é para aqueles que desejam realmente, apesar dos defeitos e dificuldade intrínsecos a natureza humana, pois se assim não for, qual dos doze poderia ser discípulo?

O texto de Marcos 10 nos ensina que a vida eterna não pode ser obtida como um produto que se herda ou compra. Sua busca deve levar àquele que a almeja, ao desenvolvimento de uma espiritualidade madura, que restabeleça os relacionamentos sociais corrompidos pelo pecado. Esta espiritualidade transforma aquele que se coloca na busca em sujeito ativo nas mãos de Deus, segundo o venha do Teu Reino da oração ao Pai.

O sintoma da presença do Espírito Santo na vida do Cristão, e conseqüentemente, da maturidade espiritual, pode ser constatado mais claramente através dos tipos de relacionamento que o cristão constrói em sua teia de relacional, do que pelo número de prosélitos, boas obras ou milagres produzidos por este.

Façamos como os discípulos, sigamos a Jesus. Aceitemos o desafio proposto por ele e sejamos seus representantes neste mundo que precisa tanto das palavras de Salvação. Que a salvação que nos alcança prossiga para além de nós mesmos, de forma que sejamos mais um elo na corrente, e não o fim dela.

Quanto à resposta da Pergunta inicial, Deus ama a todos os seres humanos de igual forma, rico ou pobre. Mas a diferença que há entre as pessoas é a capacidade de abrir mão de si mesmo para tomar posse da vida eterna.

Monday, May 29, 2006

O pecado na multiplicação - Uma leitura de Genesis 6:1-10

O pecado na multiplicação..

Uma leitura de Genesis 6:1-10

Toda leitura bíblica deve gerar em nossos corações algo novo. Velhas verdades que tornam-se fontes de novos pensamentos e vida. Por isto, a Bíblia é como a nascente de um grande rio que rega nossas vidas e purifica nossos corações do erro e do pecado. Gostaria de apresentar uma leitura bíblica necessária aos nossos dias e à nossa cultura, tendo em vista as semelhanças entre o texto e nossa realidade humana.

O texto de Gênesis 6 narra a aventura humana em seus primórdios. Podemos observar que a humanidade, formada por aqueles que conhecem e por aqueles que não conhecem a Deus, se multiplicou, evoluiu culturalmente e neste processo se misturou etnicamente. Este processo de miscigenação, na cosmovisão antiga, era comum para se construir alianças que tornavam o povo poderoso e capaz de grandes proezas como guerras, conquistas e construções. Para nós, que somos brasileiros e temos em nossa cultura a miscigenação como algo normal, tal parece-nos um procedimento louvável. Todavia, o texto afirma nas entrelinhas que por trás deste fato havia propósitos que não se enquadravam com os propósitos de Deus para seus filhos. Assim, Deus diz que o homem é carne, e por causa disto seu Espírito não lutaria com o homem eternamente. Em outras palavras, o Espírito de Deus não insistiria para sempre com o indivíduo humano para que ele ande em caminho correto. Então, por causa do pecado e de sua tendência pecaminosa, seus dias seriam apenas cento e vinte anos.

No verso quarto, pode-se observar a apresentação de um outro tipo humano, que é denominado por Nephilins pelo escritor Bíblico. Estas pessoas não eram anjos nem demônios, mas um povo de cútis clara, pois a raiz hebraica desta palavra, Nephel, aponta para a cor branca, assim como adamah, que traduzimos como homem ou humanidade no primeiro verso, tem sua raiz associada à cor vermelha, tendo em vista que Adão foi feito da terra. A abordagem de que os Nephelins seriam demônios ou anjos é derivada da leitura do livro apócrifo de Enoque e de outros midraxes judaicos. Tal livro não expressa o pensamento veterotestamentário que a Igreja Cristã apregoa e, portanto não deve ser levado em consideração como Palavra de Deus.

Este povo habitava a oeste do povo apresentado no primeiro verso, isto é, se utilizarmos a tradução alternativa da palavra dias, que pode significar oeste. Eles então fizeram o mesmo que os outros homens, escolhendo mulheres para si e destas relações nasceram os grandes guerreiros da antiguidade cujos nomes estão escritos nas antigas tradições babilônicas.

Então, o verso quarto nos apresenta o fato de que tudo o que a humanidade estava fazendo era maldade e pecado, pois Deus não havia colocado a humanidade na terra para que esta fosse um povo de grandes guerreiros, ou grandes assassinos que matam homens, mulheres e crianças, que edificam impérios sob o sangue dos perdedores. Assim o texto julga que era mal o homem estar sobre a terra, pois todos os seus pensamentos eram malignicidade. Podemos então dar um significado especial ao termo andar com Deus, utilizado para Noé, pois a humanidade que Deus destruiu pelo dilúvio não andava com Deus, mas andava com a carne e seus desejos egoístas.

Tal tendência humana gerou em Deus peso no coração, que pode ser entendido como angústia, dor de estômago ou desgosto profundo, se levarmos o termo hebraico em seu sentido literal. Como um pai que descobre a marginalidade de seu filho quando este é preso pela polícia, como a esposa que descobre o adultério ou como quando lemos as noticias sobre homens públicos em que acreditamos e que nos traem por dinheiro, sexo e poder. No caso, dinheiro de nossos impostos.

Deus, no verso seguinte de Gênesis, decide limpar a criação completamente, pois o termo hebraico mahah significa lavar ou limpar para fora, no sentido de purificação. E isto deve gerar em nós a idéia clara de que Deus cuida de sua criação e tem para ela um plano, não apenas para o homem, mas para a criação como um todo. O pecado humano suja a criação com a mesma nódoa espiritual que se impregna na alma humana, diferindo apenas no fato de que a natureza mostra sua sujeira enquanto que os seres humanos tem a capacidade de mascarar com perfumes da hipocrisia e roupas da soberba seus pecados e podridões. Os grandes homens da antigüidade eram pequenos vermes que se contorciam em suas ilusões de poder e ganância, desprezando a Deus e condenando a si mesmos.

No outro lado está a personagem Noé, descanso ou aquele que descansa. Pai de família com três filhos. Descendente de Enoque, tanto na carne quanto na alma, pois andava com Deus em uma geração onde isto não era comum. Este homem comum achou graça na presença de Deus. Isto significa que Deus se agradou de Noé, mesmo ele sendo humano e falho. Deus amou a humanidade através deste homem que vivia sua vida de forma simples, plantando sua roça e buscando andar com Deus. Como Jesus disse: bem aventurando os humildes de espírito, pois deles é o reino dos céus, assim como também serão bem aventurados os mansos que, como Noé, herdarão a terra.

Noé era um homem Justo e íntegro, ou inteiramente justo, em sua geração. Isto é de importância capital para a aplicação do texto à nossas vidas, pois assim como hoje, naqueles dias o andar com Deus, ser justo, era tão difícil quanto nadar rio acima em um universo onde todos os outros seres humanos a nossa volta estão a descer. Ser justo não é legalismo barato ou pietismo de botequim, mas ver o mundo segundo a ótica valorativa de Deus. Entender que os valores do reino de Deus são mais preciosos que as mesquinharias humanas que tem como única finalidade o tapar dos buracos negros de nossa alma que o pecado humano fez.

Portanto, ao invés de lermos este texto pela ótica dos místicos e esotéricos que vêem anjos e demônios na terceira pessoa, devemos ler este texto, assim como o restante da Bíblia, como um espelho que mostra nossos pecados e falhas. Quando lemos a punição de Deus sobre a humanidade, devemos imediatamente olhar para Jesus na cruz do calvário como redentor de nossa vidas. Devemos olhar para o Jesus ressurreto como símbolo do constante amor de Deus por nós. Deveríamos caminhar no sentido de nos aproximarmos diariamente dos propósitos de Deus, dos valores Bíblicos da humildade, simplicidade e obediência a Deus, para assim encontrarmos a mesma graça que Noé encontrou em Deus.

Friday, May 26, 2006

Um novo começo...

Depois de uma introdução ao mundo dos blogs com o brlog.info estou a iniciar um novo momento, em um provedor que de melhor visibilidade ao meu trabalho...
Tenho lido sobre a atual tendendencia onde os blogs estão tornando-se os grande veiculos de propagação de idéias e trabalhos intelectuais.
Pretendo portanto expor um pouco do trabalho feito junto ao Seminário Sul Americano de Campo Grande e sobre os projetos aqui desenvolvidos...